Era mais uma noite. Ele sabia, com aquela certeza enfadonha da rotina de tantos anos, que seria apenas mais uma noite. Iria cruzar-se com as mesmas pessoas com que se cruzava há anos, ouvir as mesmas vozes a prestarem-se aos mesmos lamentos de sempre e, na melhor das hipóteses, vozes diferentes contariam histórias iguais a tantas outras, adulterando-lhes os nomes ou as vítimas.
Contudo, desta vez a rotina iria traí-lo e deixá-lo mais perto de outros hábitos, de outras certezas, de outras noites… Sentiria de novo alguns dos cheiros e das ânsias que o tempo se tinha encarregado de varrer para aquele sítio incerto dentro de nós onde guardamos, com um cuidado assustador, todas as experiências que não temos coragem ou frontalidade de assumir como nossas e como fazedoras de nós. Seria assim aquela noite em Lisboa.